O Corpo e a Consciência Segundo Altered Carbon
O livro Carbono Alterado (Altered Carbon) escrito por
Richard K. Morgan visualiza um futuro distópico onde a raça humana está
imensamente desenvolvida tecnologicamente, mas com novos dramas em função
desses avanços. O enredo é uma trama bem construída que envolve muita ação,
mistérios e conceitos fascinantes numa jornada que fará o protagonista Takeshi
Kovacs passar por situações mais desafiantes do que poderia imaginar.
A Netflix usou o livro como base e fez da série de
mesmo nome uma descrição fiel do universo apresentado. Nessa futura realidade a
tecnologia está evoluída a ponto de existirem cartões ou cartuchos corticais
que podem registrar a sua identidade ou personalidade desde o nascimento. Dessa
forma, quando o corpo morre, esse cartucho com “você” pode ser passado para
outra “capa” (adjetivo muito interessante usado para o corpo humano) e assim
vivendo indefinidamente. Essa é a premissa do livro e da série.
A questão de viver continuamente em corpos diferentes
foi sempre de cunho relevante e esse tema é abordado por diversas linhas
filosóficas, religiosas e até científicas, como a Conscienciologia. Sempre
podemos nos questionar: eu sou o meu corpo físico? Ou a minha essência vai além
de um corpo material feito carne, ossos e sistemas? Aliás, essas questões nunca
foram mais atuais em função da aceleração do nosso desenvolvimento nas mais
diversas áreas.
É interessante tanto no livro como na série o modo
como é abordada a relação entre aparência e personalidade ao mostrar, por
exemplo, uma senhora que “morreu” como avó e teve seu cartucho reativado num
corpo masculino jovem cheio de piercings e tatuagens. Ver o tratamento dos
parentes de modo natural frente uma avó naquele corpo totalmente diferente não
deixa de ser inusitado. Afinal, como uma “senhora” deveria se portar naquela
“capa” alternativa?
Com o avançar do enredo é possível vislumbrar outras
realidades muito prováveis caso a humanidade chegue nesse nível tecnológico e
também alguns contextos já bem conhecidos como, por exemplo, um grupo
minoritário de pessoas extremamente ricas e poderosas que tem controle sob
quase tudo. A ação dessa classe, também chamada de Matusa, expõe um absolutismo
que não é incomum no mundo atual.
Nesse contexto de dinheiro e poder é mostrado que se
um Matusa mata uma prostituta durante o sexo ele a recompensa com uma capa
melhorada, ou seja, mais linda e atraente. Situação bem oposta das capas
oferecidas pelo governo que são de aparência desagradável, desleixada e bem
inferiores. A crítica parece assertiva quando evidencia que o serviço público
se mostra sempre menor em relação ao que há de melhor.
Apesar de Altered Carbon mostrar um tom mais escuro e
sombrio de uma sociedade futura é provável que caminhemos para muitos desses
aspectos onde sexo, dinheiro e poder permanecem como os grandes motores das
sociedades em geral. Afinal, é possível que um dia sejamos seres que vivam de
modo mais igualitário e harmônico sem que a ambição e o prazer dominem nossas
condutas?
Outra questão marcante é a postura das pessoas
religiosas e crentes que escolhem morrer de fato ao invés de ficar mudando de
corpo. Até que ponto seria melhor optar em “ir para o céu” ao invés de viver na
matéria sem prazo de validade? Na história, um pequeno problema abordado é que
ao utilizar uma nova capa você acaba adquirindo os vícios que o mesmo possui,
ou seja, em caso de alcoolismo sente-se a necessidade de voltar a beber.
Nesse processo surge um dos eixos de todo o pensamento
humano desde a antiguidade: onde está a sede de nossa consciência? Somos
espíritos em um corpo carnal ou um cérebro incrível, mas somente biológico? A
fundamentação de transferir o que somos para um cartucho tecnológico não deixa
de representar um modo similar (e ao mesmo tempo avesso) do que a criogenia sempre
tentou: a evitação da morte.
A imortalidade foi sempre buscada pelo homem como meio
de acabar com a insegurança sobre a morte e sua inevitabilidade. O apego pelo
próprio corpo vem gerando tentativas frustradas e desesperadas para sobreviver
ao peso esmagador do tempo. A mudança de corpos em vidas sucessivas é um
conceito similar adotado por diversas linhas como o budismo, hinduísmo,
espiritismo, entre outras. Segundo a Conscienciologia, o corpo humano é chamado
de “veículo” para que a consciência utilize na dimensão física sendo, portanto,
inevitável para todas as pessoas o ciclo de morte e renascimento com a troca de
veículo ou capa a cada nova passagem terrestre.
Sempre se fala de renascimento (reencarnação, ressoma
ou metempsicose) com a perda de memória entre uma vida e outra como forma de
esquecer os erros cometidos e assim ter uma nova oportunidade de acerto
começando do “zero”. Dessa forma, aquela individualidade poderia recomeçar sem
as amarras, desilusões e culpas do que já passou. Entretanto, manteríamos a
sanidade vivendo por tanto tempo, mudando por muitos corpos, sem perder a
memória? Essa é uma questão pouco abordada pela série, pois a maioria das
pessoas, mesmo as muito “velhas” parecem manter a integridade emocional.
Mas enquanto vivermos em corpos temporários como o que
possuímos, a imortalidade será sempre um sonho ou uma verdade oculta. Será que
nossa alma, ego ou consciência já não será imortal vivendo apenas uma condição
evanescente? Até que ponto corremos atrás de uma imortalidade já existente
enquanto nos julgamos seres perecíveis e descartáveis perante a natureza?
Enquanto você não obtém sua resposta resta apenas viver e respirar nesse corpo
de carbono.
Esse texto traz apenas informações básicas.
Estude! Se aprofunde mais no assunto!
E não acredite em nada. Experimente!
Por Alexandre Pereira.
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